O negócio do crime

Esta crónica veio do Jornal de Negócios de hoje...

Visão partilhada por mim (não fosse eu tb um economista - não exerço, mas acompanho)

(...)Uma diminuição em metade, da taxa de homicídio no Estado de Belo Horizonte levaria a um incremento de 12% no valor das rendas de casa. Impressionante! Não é?1. Alta tensão em São Paulo... e não só.

Pelo menos por agora, o Estado de São Paulo está mais calmo. O PCC (Primeiro Comando da Capital), a maior estrutura do crime organizado no Brasil, decidiu parar os ataques às forças de segurança. Mas o secretário da Administração Penitenciária de São Paulo, Nagashi Furukawa, acabou por admitir que quem recuou, e aceitou as condições dos criminosos, foi o Estado.
Depois de mais de 130 pessoas terem perdido a vida, o Brasil percebeu que o crime organizado também manda. Muito e cada vez mais. O PCC reforça, dia após dia, o seu poder.

São crescentes as licitações a concursos com «carta marcada», nomeação de pessoas em cargos estratégicos no Poder Público influenciadas pelo PCC, financiamento de campanhas eleitorais, lobie para aprovar projectos no Congresso, corrupção de policiais para garantir que o tráfico de drogas, armas, e outros crimes sejam bem sucedidos.

É um enorme negócio que cresce dia após dia. E a maior economia da América Latina coloca-se todos os dias a jeito para que as coisas corram de mal a pior. Aliás, o Brasil, acaba de cair mais três posições no Índice de Competitividade Global do World Economic Forum (WEF). Isso representa o quarto declínio consecutivo desde 2001, quando o Brasil estava em 44º lugar. A economia brasileira apresentou mesmo o pior desempenho: ficou em 80º lugar. Isso devido a factores como burocracia ineficiente, elevadas taxas de juros, gastos públicos, corrupção, custo da criminalidade, legislação trabalhista restritiva e fraca infra-estrutura. Para os brasileiros, para quem investe no Brasil ou para quem está no mundo dos negócios é decisivo saber que o custo do crime é pesado.

2. A pesada factura do crime organizado

É portanto um facto que a factura que os brasileiros pagam todos os dias por causa do crime, da violência e da corrupção, é pesada e crescente. Valores exactos não existem. A literatura sobre custos da criminalidade no Brasil ainda é incipiente. Os primeiros trabalhos surgiram na década de 1990. Mas um dos autores que mais tem investigado esta temática, Irene Khan, afirma que os custos da violência atingiram 3% do PIB do Estado de São Paulo em 1999 e de 5% no Estado do Rio de Janeiro.

Obviamente são contabilizados os custos directos: bens e serviços públicos e privados gastos no tratamento dos efeitos da violência e prevenção da criminalidade no sistema de justiça criminal, custos suportados com o sistema prisional, serviços médicos, serviços sociais e protecção das residências.

Mas ficam de fora desta conta de somar, por serem muito difíceis de quantificar, a despesa indirecta. Perda de investimentos, bens e serviços que deixam de ser captados e produzidos em função da existência da criminalidade e do envolvimento das pessoas (agressores e vítimas) nestas actividades.

O que hoje é certo, é que a violência produz importantes perdas para o conjunto do País. Ela reduz o desenvolvimento económico e afecta directamente diferentes indicadores sociais. Do ponto de vista económico, a violência tem pelo menos três efeitos importantes. No que concerne ao capital humano da sociedade, a violência reduz esse mesmo capital, mediante a perda directa de vidas e do impacto da insegurança sobre a produtividade do trabalho. Do ponto de vista do capital físico, a violência, por meio da utilização de recursos – mão-de-obra e equipamentos – para combater o crime, também afecta o nível e a composição do produto do País e altera aquilo a que os economistas designam por alocação óptima dos inputs, através da reorientação do espaço urbano e da inibição de oferta de trabalho, por exemplo.

Para se ter uma ideia da influência do crime em toda a economia brasileira, mesmo nos nichos, nos mais pequenos segmentos, pense-se nisto:
a diminuição na taxa de homicídio por cem mil habitantes em uma unidade elevaria a renda mensal das casas em 0,61%.
Ou fazendo as contas de outra maneira, para um caso mais concreto, uma diminuição, para metade, da taxa de homicídio, no Estado de Belo Horizonte, levaria a um incremento de 12% no valor das mesmas rendas.

Impressionante! Não é?


3. Economia do crime... soluções à vista?

Estamos alinhados. O crime, perdoem-me a fria análise mas este é um jornal de economia, custa caro. A todos. Todos os dias. Mas combater o crime custa dinheiro. A indústria brasileira de segurança privada que o diga. Entre 2002 e 2005 aumentou a facturação em 68%. É por isso importante saber o que hoje se pensa ser a melhor estratégia de combate à criminalidade, tendo em conta os custos envolvidos. Ou seja a estratégia mais eficiente.

Um dos autores pioneiros deste assunto, a chamada Economia do Crime, tem sido Gary Becker, sociólogo e economista da Universidade de Chicago (vencedor do Prémio Nobel de Economia de 1992). O autor deixou discípulos que estudam a problemática sobretudo na Universidade de Nova Iorque e na London School of Economics.

De maneira bastante resumida, a Economia do Crime afirma que a criminalidade é uma opção individual, que é determinada por várias variáveis como o emprego, efectividade do sistema de justiça criminal e nível de investimentos na segurança pública. Assim, um criminoso actuaria quase sempre (não há regra sem excepção) de forma racional, porque tem uma percepção dos custos e dos benefícios das suas atitudes.

A tese está provada (através de uma série histórica de 20 anos com dados recolhidos nos EUA) e revela que oportunidades de emprego e efectividade do sistema de justiça criminal realmente são factores decisivos na maior ou menor expressão do fenómeno da criminalidade. Investimento na educação, redução das diferenças sociais também ponderam na redução do crime. Não basta ter mais polícias na rua. É preciso investir em muitas outras áreas. Até porque como se diz por estes dias no Brasil, «o crime está sentado no Palácio».(...)

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